As mulheres são as responsáveis pelo clima de paz em Kakuma, na África, estão à frente de tudo: criaram uma revista feminina, reduziram o índice de contaminação por HIV e ainda patrulham tradições como o casamento forçado.
Esquecido pela chuva, o lugar vive sob uma névoa de areia. O calor derrete e o sol de inverno doura os telhados feitos de latas de óleo. Nesse cenário, as mulheres se destacam como verdadeiras heroínas, já que aprendem novas habilidades para socorrer quem tem menos que elas. Entre muitas, foram escolhidas apenas cinco mulheres para apresentar à reportagem.
AS HEROÍNAS ANÔNIMAS DA ÁFRICA
Lucy N'Ganga, 32 anos, é um delas. A enfermeira está ali por opção. Embora converse por telefone todos os dias com o marido, um capitão do Exército, e as duas filhas, só pode vê-los a cada dois meses, quando vai para casa, em Nairóbi, capital do Quênia (visitas são proibidas nos campos). Eles entenderam a importância que ela dá à luta que escolheu. Nunca me imaginei levando uma vida pacata, quero estar onde mais precisam de mim.“
Sua missão é coordenar campanhas de prevenção à malária e à Aids. "Me realizo ao perceber que despertei uma mulher para a vida. Num mundo onde os rios são secos, o trabalho dela é fundamental. Assim como são imprescindíveis o otimismo de Jenta, a coragem de Mary, a solidariedade de Ester, a dedicação de Angela e a garra de Florence.
Esses ingredientes fazem o sonho continuar existindo nos corações de Kakuma.
Sua missão é coordenar campanhas de prevenção à malária e à Aids. "Me realizo ao perceber que despertei uma mulher para a vida. Num mundo onde os rios são secos, o trabalho dela é fundamental. Assim como são imprescindíveis o otimismo de Jenta, a coragem de Mary, a solidariedade de Ester, a dedicação de Angela e a garra de Florence.
Esses ingredientes fazem o sonho continuar existindo nos corações de Kakuma.
Ester se destaca no combate à Aids. Há dois anos, ela vive rodeada por portadores de HIV. Ainda lidera grupos que batem de porta em porta para explicar a importância da camisinha. A taxa de infecção de HIV em Kakuma é de 2,5% - mais baixa do que a média da África subsaariana, que chega a 7,4%.
Ester comemora o resultado, sabe que tem participação nele. Por seu trabalho, ganha do International Rescue Committee (IRC) um incentivo de 30 dólares por mês, o que ajuda a sua família. Eles dormiram ao ar livre por dez meses até arrumar um pedaço de chão para erguer uma casa. Para Ester, isso não é nada. Ela viveu por 30 anos num campo de refugiados na Tanzânia. Ali conheceu o marido. Em 1995, os dois voltaram, com quatro filhos, ao Burundi.
Um mês depois, o marido foi preso na igreja onde era pastor. De novo, tomaram a estrada poeirenta atrás de liberdade. Deixaram um filho, de quem até hoje não têm notícias.
Quando um parente reaparece, Kakuma se acende e festeja. Também tem festa em datas como o ano-novo.
Mary Bosco é quem gosta de lembrar que, ali, três verbos têm muito valor: reunir, unir e compartilhar. As mulheres se juntam para orar, resolver problemas - existem 350 grupos de ajuda - e comemorar no momento em que alguém conquista asilo definitivo em outro país. A pessoa vai embora, mas não esquecerá Kakuma jamais.
Ester comemora o resultado, sabe que tem participação nele. Por seu trabalho, ganha do International Rescue Committee (IRC) um incentivo de 30 dólares por mês, o que ajuda a sua família. Eles dormiram ao ar livre por dez meses até arrumar um pedaço de chão para erguer uma casa. Para Ester, isso não é nada. Ela viveu por 30 anos num campo de refugiados na Tanzânia. Ali conheceu o marido. Em 1995, os dois voltaram, com quatro filhos, ao Burundi.
Um mês depois, o marido foi preso na igreja onde era pastor. De novo, tomaram a estrada poeirenta atrás de liberdade. Deixaram um filho, de quem até hoje não têm notícias.
Quando um parente reaparece, Kakuma se acende e festeja. Também tem festa em datas como o ano-novo.
Mary Bosco é quem gosta de lembrar que, ali, três verbos têm muito valor: reunir, unir e compartilhar. As mulheres se juntam para orar, resolver problemas - existem 350 grupos de ajuda - e comemorar no momento em que alguém conquista asilo definitivo em outro país. A pessoa vai embora, mas não esquecerá Kakuma jamais.
Jenta também se sentiu no dever de educar. É uma das raras somalis com diploma da escola secundária e decidiu enfrentar a cultura muçulmana defendendo o estudo para as meninas. "Se uma garota falta muito, vou à casa dela, cobro dos pais que a mandem de volta para as aulas", revela. Da alfabetização, partiu para a crítica ao casamento precoce - muitas adolescentes ainda têm de se submeter a ele. A batalha de Jenta tem provocado mudanças. “Os homens estão mais tolerantes, porque percebem a necessidade de educação para as filhas e sabem que a lei aqui é a das Nações Unidas e não a do seu país", explica. Espero que levem a nova mentalidade ao voltarem para casa." Ela não imaginava que desenvolveria essa consciência até abandonar, em 1991, o Burundi, com sua casa em chamas - o pai fora degolado e dois irmãos acabaram capturados por soldados de outra etnia. Nos seis anos seguintes, enfrentou mais separações, além de uma perda: a mãe ficou doente e não resistiu, uma irmã foi conduzida para o Canadá, a outra para os Estados Unidos. Jenta não conseguiu repatriação, se casou, teve dois filhos e foi mandada com a família para Kakuma.
Mary foi obrigada, ainda jovem, a se casar com o cunhado porque a irmã morrera. "Esse é o costume no meu país", conta. Criou três sobrinhos como filhos. Em 1999, o cunhado-marido desapareceu e ela acabou presa por tropas do governo numa reunião do conselho de igrejas. Acusação: converter muçulmanas ao cristianismo. Foi estuprada e torturada. Conseguiu fugir três semanas depois, mas caiu nas mãos de guerrilheiros rebeldes.
As cenas de estupro se repetiram até Mary aceitar o casamento com um oficial. Fugiu de novo, pegou uma carona num caminhão, que parou no Quênia, pediu asilo e, dias depois, entrava em Kakuma. Cheguei moral e fisicamente destruída... Não sei como não morri de depressão", lembra. O que lhe garantiu energia foi o reencontro com os sobrinhos."Para mim, vê-los vivos foi como um milagre." Mary se recuperou e virou uma ativista. Sua causa? Lutar contra a violência sexual. Ela denunciou inúmeros estupros e coordena grupos que encorajam mulheres a não se calar diante das agressões. Por causa do trabalho, ganhou a confiança das sudanesas e, é claro, a antipatia dos homens, acostumados a um modelo de sociedade onde a mulher vale menos do que os bois que eles criam.
As cenas de estupro se repetiram até Mary aceitar o casamento com um oficial. Fugiu de novo, pegou uma carona num caminhão, que parou no Quênia, pediu asilo e, dias depois, entrava em Kakuma. Cheguei moral e fisicamente destruída... Não sei como não morri de depressão", lembra. O que lhe garantiu energia foi o reencontro com os sobrinhos."Para mim, vê-los vivos foi como um milagre." Mary se recuperou e virou uma ativista. Sua causa? Lutar contra a violência sexual. Ela denunciou inúmeros estupros e coordena grupos que encorajam mulheres a não se calar diante das agressões. Por causa do trabalho, ganhou a confiança das sudanesas e, é claro, a antipatia dos homens, acostumados a um modelo de sociedade onde a mulher vale menos do que os bois que eles criam.
Florence também chegou de caminhão, escapando da perseguição política, no início dos anos 90. Cruzou a fronteira deixando tudo para trás, inclusive uma filha e o marido, que lutava na guerra civil em Uganda. "Ouvi dizer, depois, que ele morreu", conta com certa passividade. Por nove anos perambulou como nômade até parar em Kakuma, onde reencontrou a filha. Há três anos, se tornou líder comunitária. Foi assim: um ministro de Estado visitava o campo quando Florence fez um contundente discurso sobre a condição das mulheres. Para se expressar melhor aprendeu inglês. Também fez um curso de culinária industrial e montou um grupo para preparar refeições em eventos organizados pelas agências internacionais. No início de 2005, entrou para o jornal comunitário e criou a Women's View, uma revista para mulheres. "É assim que ganhamos voz para denunciar nossos problemas", explica, com firmeza impressionante.
Angela ainda tem feridas abertas na alma. Ela saiu de Uganda em 2003, dois anos após o assassinato do marido. Estava tentando superar o trauma - até abriu um restaurante -, mas não suportou a pressão: caiu na estrada depois que um dos quatro filhos teve o mesmo destino do marido. Ao chegar, estranhou a pequena cota de alimentos que as famílias recebem. "É difícil ser viúva aqui. Seu filho pede mais comida, você não pode dar e não tem com quem dividir essa angústia." Angela parou de chorar ao perceber que educar crianças num local como Kakuma seria um desafio. "Elas não sabem o que é a paz, são filhos da guerra", comenta a agora professora de religião e de inglês numa das escolas improvisadas do campo. "Na sala de aula, redescobri o amor pelos seres humanos."
Angela ainda tem feridas abertas na alma. Ela saiu de Uganda em 2003, dois anos após o assassinato do marido. Estava tentando superar o trauma - até abriu um restaurante -, mas não suportou a pressão: caiu na estrada depois que um dos quatro filhos teve o mesmo destino do marido. Ao chegar, estranhou a pequena cota de alimentos que as famílias recebem. "É difícil ser viúva aqui. Seu filho pede mais comida, você não pode dar e não tem com quem dividir essa angústia." Angela parou de chorar ao perceber que educar crianças num local como Kakuma seria um desafio. "Elas não sabem o que é a paz, são filhos da guerra", comenta a agora professora de religião e de inglês numa das escolas improvisadas do campo. "Na sala de aula, redescobri o amor pelos seres humanos."
Pense nisto!
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Eita! Mulheres fortes.
Fonte: Revista Cláudia/2009
14 comentários:
Norma
Muito especial este seu post, a gente ouve, le sobre a situação em alguns paises, mas ver assim as pessoas é muito reconfortante apesar de terrivelmente doloroso.
Beijos
São mulheres fortes que superaram suas dores e foram a luta. Obrigada Angela pelos comentários. Abraços
E uma dessas lutadoras se chama Angela.
Norminha, estas mulheres valem mais do que mil.
Muita força dentro da alma. Muito peito para lutar. Bijussss
Estas são exemplos de vida. Obrigada Marcos
Norma, estas mulheres realmente são nota 10. Abraço
Dá vontade de largar tudo e ir para a África ajudar nestes campos. Abraços
Que mulheres retadas! Quanta força tem dentro destas almas. Paz e Luz! beijinhos
Excelente espaço para reflexão. Linda matéria. Parabéns. Voltarei mais vezes.
Fique com a Paz Profunda.
Saudações Florestais !
Muito obrigada pelos comentários. Esta soma engrandece o blog. Estas mulheres forte tem beleza na alma indescritível!
Abraços perfumados
Mulheres que fazem a diferença! Abraços
É verdade, existem pessoas que fazem a diferença. Abraços
Como sempre, as mulheres demonstram sua sensível força, seu incrível modo de enxergar a vida, de maneira ampla. Fascínio e encanto que essa força que as mulheres produzem.
Olá Diário de uma alma, obrigada. É verdade, a força e fascínio que estas mulheres exercem é muito grande. Abraços
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